1) Qual foi a evolução do texto publicitário nos últimos anos?
R. Na minha opinião, o que houve foi uma involução. Até o final da década de 90, o texto era uma das principais ferramentas de argumentação na hora de vender um produto. Era no texto onde se apresentavam os diferenciais do produto/serviço e onde acontecia a sedução.
Muita gente culpa as novas tecnologias e o fato das pessoas estarem lendo menos. Eu acho isso que esses motivos não contam toda a história e nem são totalmente verdade: as novas tecnologias permitiram um acesso fácil e rápido a todo tipo de leitura, e com e-books e compras pela internet, nunca se consumiu tantos livros como hoje. As pessoas estão lendo, sim. O que, eu não sei.
Uma das coisas que eu acho é que a sedução mudou de figura: hoje em dia, escrever “18 X sem Juros” é um argumento mais poderoso do que 5 linhas de retórica bem escrita. Outra coisa que limita as cantadas dos redatores é a complexidade dos produtos: antes para comprar um TV, você só precisava escolher o tamanho. Hoje tem que saber o que é:
- Resolução 1366×768.
- Frequência 60 Hz.
- Picture Engine DNIe+.
- Dynamic Contrast Ratio HighContrast.
- Wide Color Enhancer (Plus) Wide Color Enhancer.
- Dolby Digital Plus/ Dolby Pulse.
- SRS TheaterSoundHD.
- dts2.0 + Digital Out.
- Potência(RMS) 5Wx2.
- Speaker Type Down Firing + Full Range.
- 2 entradas HDMI
(dei um ctrl C + ctrl V, só de um pedaço dos features de uma TV Samsung no site da Fast Shop – deu para sentir o drama). Não existe texto que encaixe essa quantidade de informações e consiga manter uma clareza de raciocínio. Bullets fazem isso muito melhor.
É Possível que num futuro, a argumentação de um texto volte a ser valiosa como ferramenta de vendas. Mas hoje em dia não é. Lembrando que a pergunta foi sobre a evolução do texto, e não da função do redator.
2) Qual é o panorama atual da redação publicitária, no Brasil e no mundo?
R. O panorama atual da redação no Brasil e no mundo? A redação publicitária é algo orgânico que se adapta ao produto, ao público, à mídia, à idéia, ao mercado, à situação econômica, ao perfil do redator, ao momento da marca, ao tipo de veiculação e muitos outros fatores.
Para responder à sua pergunta, eu ainda teria que considerar uma grande variedade de marcas, que permitissem uma visão geral (panorama). Isso é impossível.
O que dá para dizer é que tem coisa muito boa e muito ruim sendo feita em todos os lugares. Como exemplo de coisas muito boas, cito os textos dos comerciais de “Old Spice”, que há 2 anos ganham tudo em todas as premiações. Em termos de coisas ruins, fico com os merchandisings dos programas matinais, cujos textos são tão travados que engasgariam o melhor dos apresentadores (ainda mais os que estão lá).
3) Os novos formatos de publicidade alteraram a forma como o texto publicitário é desenvolvido?
Sim!
4) Os meios digitais e o texto publicitário qual é a relação existente?
R. Como meios digitais, a primeira coisa que vem à cabeça é internet. Eu prefiro considerar como digitais todos os meios que permitem uma troca entre o emissor e o receptor, e não apenas a propagação da mensagem. Na minha opinião, a grande novidade dos meios digitais é a conversa.
Na propaganda e na vida, para que haja conversa, os dois interlocutores precisam se colocar na mesma altura. Se um tentar se impor ao outro, vai dar briga ou pior: o outro vai deixar você falando sozinho.
É assim que os produtos (conseqüentemente, a redação publicitária) precisam se comportar nos meios digitais: sem gritar nem tentar ‘se achar’.
Olha… é bem difícil convencer um diretor de marketing a assumir esse tom. Mas se ele compra essa idéia, é sucesso praticamente garantido.
O melhor exemplo é o site da Apple. Os textos são fluidos, quase um bate-papo.
Sobre os anúncios em redes sociais: leia a resposta acima e acesse seu perfil no Facebook.
Veja bem o estilo dos anúncios e você vai perceber porque nunca clicou em nenhum.
5) Mídias sociais e a redação de conteúdo (como se relacionam)?
R. Mídias sociais e redação de conteúdo: eu tenho vergonha de ler o português escrito no Facebok/Orkut/Twitter. Não é culpa do mixuguês. É falta de cultura mesmo. Um exemplo que compromete a leitura é a quantidade de “Mas” escrito “Mais”. É assustador.
E os geradores de conteúdo online não estão muito longe disso (jornalistas e publicitários).
A maior parte dos textos que eu leio não são claros. Eu desisto na 3º linha.
6) Big idea (para você)?
R. Não é nada fácil achar a Big Idea.
Criatividade é a soma de duas coisas conhecidas para se chegar em um resultado inédito. Para mim, os fatores que precisam entrar na equação da Big Idea são a alma do produto e a situação dele no mercado.
Para chegar nesses números, só com um planejamento profundo, mas traduzido de maneira clara.
7) Tendências – o futuro da redação publicitária quais são suas expectativas?
R. Em vez de falar sobre tendências sobre redação, prefiro falar sobre a tendência para o trabalho dos redatores: o mundo do jeito que ele é, está nos permitindo contar cada vez mais histórias mais complexas, que ganham novas facetas em cada mídia. Isso é maravilhoso, pois inventar é a nossa profissão.
O problema é que pouquíssimos clientes (e um igual numero de redatores está preparado para isso). O que vemos com mais freqüência é a replicação do mesmo conteúdo nos mais diversos meios.
São muito poucos os profissionais que vão desbravar esse mundo novo. Trabalhe igual a uma camela, e se você tiver sorte, pode estar entre eles.
Natalia Costa e Claudia Desly